Quero fazer minha primeira declaração de imposto de renda na França, quais são as etapas? Como reduzir o imposto final? O que é o formulário 2024? Posso declarar o IR de forma retroativa? Encontre aqui neste post sobre como fazer a primeira declaração de imposto de renda na França, os detalhes e as respostas de muitas outras dúvidas recorrentes neste post.
Primeiras palavras
Quando chegamos na França, é comum nos perguntarmos se devemos fazer a declaração de imposto de renda no novo país. E ainda, muitas vezes sentimos receio por não dominar bem o idioma ou por não entender como o processo funciona, especialmente para estrangeiros. Na nossa primeira postagem, tratamos do Imposto de Renda (IR) francês de maneira geral, destacando as informações mais importantes.
Agora, nesta segunda postagem, vamos entrar em mais detalhes para quem já está há algum tempo na França e tem uma renda mais estabilizada. Em seguida, explicaremos como proceder para fazer sua primeira declaração de imposto de renda, especialmente para estrangeiros, e abordaremos os principais pontos sobre o formulário 2024.
Sem mais delongas, vamos em frente!
Como fazer a primeira declaração IR?
É comum chegar na França e não saber exatamente quando ou se é necessário declarar o Imposto de Renda. A regra geral é que, se a pessoa está no país por mais de 6 meses (183 dias), ela deve fazer a declaração. Declarar o imposto é importante para estar em conformidade com a lei, além de ser um documento necessário para diversas situações, como comprar uma casa, alugar um imóvel, ou até mesmo investir em contas especiais.
A seguir, vamos abordar cada uma das etapas envolvidas na primeira declaração:
O que declarar na primeira IR?
Ao clicar no link do título, você poderá ver detalhadamente quais tipos de renda precisam ser declarados e em quais casos as rendas são exoneradas (ou seja, não precisam ser declaradas). Abaixo, resumimos os principais casos para recém-chegados na França, especialmente aqueles que vieram para estudar:
1. Atividade assalariada:
Se você estiver trabalhando enquanto estuda, será isento de imposto se sua renda total no ano for inferior a três vezes o SMIC mensal bruto. Isso inclui trabalhos de estudante, empregos temporários de verão e outras atividades. Para 2024, o SMIC (salário mínimo) é de 1.766,92 € mensais, o que define um limite de 5.300 € anuais para a isenção.
2. Estágio e bônus:
A renda proveniente de estágios em empresas (como estágios de verão, “alternance”, ou projetos de final de estudos) é isenta de imposto se for inferior ao SMIC anual. Por exemplo, em 2017, o limite de isenção foi de 21.203 €.
3. Bolsa de estudos e APL (CAF):
Rendas provenientes de bolsas de estudo e o APL (Ajuda ao Alojamento) da CAF são exoneradas e não precisam ser declaradas.
Preenchimento da declaração de imposto de renda
O primeiro passo para fazer a sua declaração de imposto de renda é preencher o formulário chamado “2024”, mencionado anteriormente. Além disso, você precisará anexar alguns documentos padrão, como:
- Título de permanência (titre de séjour) e passaporte.
- Comprovante de residência referente ao dia 31 de dezembro do ano da declaração (pode ser um contrato de aluguel ou contas de eletricidade/gás).
- Para quem mora sem pagar aluguel, será necessário o formulário de “attestation d’hébergement”, que comprova o alojamento gratuito.
Documentos complementares para estrangeiros
Se você é estrangeiro e não teve trabalho no ano de declaração, ou se seu sustento veio de bolsas de estudo do governo brasileiro ou francês, é recomendável anexar um documento explicativo. Essa carta deve explicar por que não há valores a serem declarados no formulário 2024, que provavelmente terá poucas informações no caso de estudantes ou recém-chegados.
Além disso, é necessário incluir o RIB (informações bancárias), de preferência de uma conta francesa, para que eventuais restituições possam ser transferidas.
Envio do IR
Existem duas formas principais de enviar sua declaração de Imposto de Renda (IR) na França: pelos correios ou diretamente no guichê do governo. Em ambos os casos, você deve se dirigir à Direction Générale des Finances Publiques do seu departamento.
1. Envio pelo correio
Essa é uma opção prática e eficiente. No meu caso, preenchi o formulário online e enviei diretamente pelos serviços da La Poste, que se encarrega de entregar no departamento competente. Esse método é simples e rápido. Sempre uso o serviço para enviar cartas, pois evita burocracias. Se quiser saber mais sobre como usar a La Poste, clique [aqui].
2. Entrega no guichê
A entrega diretamente no guichê da Direction Générale des Finances Publiques tem a vantagem de contar com o apoio de um servidor público. Ele pode ajudar a preencher os formulários, garantindo que não haja erros. No entanto, a disponibilidade de ajuda pode variar de um local para outro, e nem sempre é garantido que os funcionários estejam dispostos a oferecer assistência completa.
Acesso da conta online no impots.gouv.fr
Após o envio do formulário no final de maio, você deve receber, por volta de agosto, o “avis d’imposition”. Esse documento indica o seu Número de Identificação Fiscal (NIF), composto por 13 dígitos. O NIF é semelhante ao CPF no Brasil ou ao número de sécurité sociale na França, sendo essencial para identificar cada contribuinte na esfera fiscal.
Com o NIF em mãos, você poderá tentar acessar o site impots.gouv.fr utilizando a função “Esqueci minha senha”. Caso tenha dificuldades ou o sistema não permita o acesso, será necessário comparecer à Direction Départementale des Finances Publiques (DDFIP) mais próxima para confirmar sua identidade com um documento oficial. Após a validação, você poderá acessar sua conta utilizando sua data de nascimento como senha temporária.
No ano seguinte, ao fazer a declaração novamente, o sistema se tornará ainda mais simples. A plataforma online preencherá automaticamente várias etapas, tornando o processo muito mais prático e rápido.
Preenchendo o formulário 2024 passo a passo
Ao se deparar com o formulário de declaração de renda na França, é normal se sentir um pouco intimidado pelos termos novos. Para facilitar, abaixo estão as principais informações que precisam ser preenchidas em cada página do formulário.
Página 01: Informações pessoas
A primeira página solicita os dados principais do contribuinte e, caso declare junto com o cônjuge, as informações dele também. Isso se refere ao “foyer fiscal” — o núcleo familiar para fins fiscais. Além disso, você deve informar o histórico de mudanças de residência se tiver alterado seu endereço ao longo do ano N-1 (ano da declaração).
Página 02: Quociente familiar
Na segunda página, você preencherá informações sobre seu estado civil e dependentes. Esses dependentes podem ser filhos ou pessoas inválidas que dependem financeiramente de você. É essencial declarar corretamente quaisquer mudanças no estado civil, como casamento ou divórcio, pois isso pode impactar significativamente o valor do imposto final.
Um ponto importante a destacar é que os filhos podem ser considerados dependentes até os 25 anos, desde que estejam estudando.
Página 03: Decomposição da renda
Nesta página, você deve declarar todas as suas fontes de renda. Para quem trabalha com contrato CLT (ou CDI na França), geralmente basta preencher a linha “Traitement et Salaires” (1AJ). Se você possui investimentos, será necessário preencher a seção “2 – Revenus de capitaux mobiliers”, que trata dos rendimentos financeiros.
Página 04: Dedução, redução, crédito e retenção de imposto
Na França, existem várias formas de reduzir o imposto final, seja diminuindo a renda tributável, deduzindo doações e pensões, ou aproveitando possíveis créditos de imposto. Essa página permite que você indique tais deduções, créditos ou reduções, itens que serão tratados logo em seguida
Páginas 05 e 06: Primeira declaração de renda
Essas últimas páginas são destinadas a quem está fazendo a primeira declaração de imposto de renda na França. Aqui, você deve indicar os documentos adicionais que precisam ser enviados, como discutido anteriormente. Essa etapa é essencial para completar a sua primeira declaração corretamente.
Entrando nos detalhes sobre o imposto de renda francês
Agora que abordamos o processo geral do Imposto de Renda (IR) na França, podemos entrar em alguns detalhes específicos que merecem destaque.
Créditos fiscais disponíveis
Diferente das deduções e reduções de imposto, os créditos fiscais se aplicam diretamente no valor do imposto final após o cálculo das alíquotas e dos ganhos com investimentos. A principal vantagem dos créditos fiscais é que, se o valor do crédito for maior do que o imposto devido, o contribuinte receberá o excedente como reembolso. Ao contrário das deduções e reduções, o valor do crédito fiscal não pode ser reportado para os anos seguintes.
Algumas das principais situações que geram créditos fiscais incluem:
- Custos com a guarda de crianças (creche, babá, etc.)
- Empregar um assalariado em domicílio (faxineira, cuidador, etc.)
- Investimento em florestas ou reflorestamento
Cada uma dessas opções tem características específicas e regras próprias para serem aplicadas corretamente. Para mais informações sobre as diferenças entre dedução, redução e crédito de imposto, recomendo a leitura do post da Finance Heros, que é bastante completo.
Tributação sobre os diferentes fontes de renda
Cada fonte de renda na França tem suas próprias características de tributação. A seguir, vamos comentar brevemente sobre algumas dessas principais fontes:
1. Salário e atividade autônoma
As atividades assalariadas e autônomas são tratadas de maneira distinta no sistema tributário francês. No caso dos autônomos, há categorias específicas, como Benefícios de Indústria e Comércio (BIC) e Benefícios Agrícolas (BA), que têm suas próprias regras fiscais e benefícios associados.
2. Aposentadoria e pensões
A tributação de aposentadorias e pensões depende de dois regimes principais, o RVTO (Régime des rentes viagères à titre onéreux) e o RVTG (Régime des rentes viagères à titre gratuit), ambos já explicados no post sobre o PER (Plan Épargne Retraite). Resumidamente, a tributação varia conforme a origem da pensão — seja de uma Assurance Vie ou de um PER, por exemplo — e se o imposto foi pago ou deduzido previamente no momento da contribuição.
3. Ganhos com investimentos
Os ganhos com investimentos são, em geral, sujeitos à Prélèvement Forfaitaire Unique (PFU), também conhecido como flat tax de 30%. No entanto, com o uso correto de contas especiais (como PEA, Assurance Vie ou PER) na França, esse valor pode ser significativamente reduzido, havendo isenção sobre os ganhos em alguns casos. Vamos entrar em mais detalhes sobre o PFU em seguida.
4. Venda imobiliária
Na venda de imóveis, qualquer valor de venda que exceda o valor de compra é considerado um ganho tributável, exceto no caso de residências principais, que são isentas. A tributação sobre ganhos imobiliários depende do tempo de retenção do imóvel. Além disso, diferentes tipos de impostos podem ser aplicados, como impostos sobre o ganho de capital e contribuições sociais.
Imposto “Prélèvement Forfaitaire Unique (PFU)”
O Prélèvement Forfaitaire Unique (PFU), também conhecido como Débito Direto de Taxa Fixa Única, foi introduzido em 2018. Ele combina dois impostos principais:
- Imposto sobre o ganho de capital: 12,8%
- Imposto de contribuição social: 17,2%
Esses dois impostos somam 30%, que é aplicado sobre a diferença entre o valor de compra e o valor de venda de investimentos. No entanto, o imposto sobre o ganho de capital (12,8%) pode ser exonerado em algumas circunstâncias, como no caso de contas especiais já mencionadas aqui, como a Assurance Vie e o PEA (Plan d’Épargne en Actions).
Todos os investimentos de base na França estão sujeitos ao PFU, mas ao utilizar essas contas especiais, você pode reduzir significativamente o impacto tributário sobre seus ganhos.
Perguntas frequentes sobre o IR na França
Nesta seção, vamos responder a algumas das perguntas mais frequentes sobre o Imposto de Renda (IR) na França, com base em dúvidas comuns nos fóruns.
Posso dividir meus rendimentos com meu cônjuge?
Sim, como vimos na parte sobre o quociente familiar, a renda do casal é considerada em conjunto no cálculo do imposto. No entanto, a partir de 2025, será implementada uma nova regra que define como padrão a taxa de imposto individual para cada cônjuge, em vez da taxa única aplicada ao lar fiscal, como é feito atualmente. Essa mudança foi explicada em uma reportagem do Le Figaro.
Anteriormente, o imposto retido na fonte aplicava a mesma taxa para ambos os cônjuges, independentemente de quem ganhasse mais. Na maioria dos lares, onde o homem tende a ganhar mais, essa prática acabava ajudando quem recebe mais e prejudicando quem recebe menos. Com a nova regra, cada cônjuge terá sua taxa de imposto individual, ajustada de acordo com a própria renda.
O que é dedução na fonte?
A dedução na fonte é um mecanismo que reduz a renda tributável antes de calcular o imposto final. Em outras palavras, ao calcular o imposto a pagar, certos valores são subtraídos da renda bruta, como a dedução de 10% para custos profissionais e a dedução para famílias de renda modesta. Isso ajuda a diminuir o valor do imposto final, tornando o cálculo mais justo, especialmente para quem tem renda mais baixa.
O que acontece em caso de atraso da declaração de imposto?
Se você não declarar o Imposto de Renda (IR) no prazo estipulado, algumas penalidades serão aplicadas. As principais sanções são:
- Majoração do imposto: O valor previsto originalmente (fora do valor já retido na fonte) será aumentado de acordo com os seguintes casos:
- 10%: Se não houver notificação oficial do governo sobre o atraso.
- 20%: Se a declaração for feita dentro de 30 dias após a notificação oficial.
- 40%: Se a declaração for feita após 30 dias da notificação oficial.
- Juros sobre o imposto: Além da majoração, aplica-se um juros de 0,2% por mês sobre o valor do imposto previsto.
Se o atraso persistir, a situação pode se agravar. O governo pode estimar o valor que você deveria ter pago, o que geralmente é desvantajoso. Em casos extremos, pode haver ações judiciais, sanções, penalidades adicionais e até a perda de direitos sociais e vantagens fiscais.
É fortemente recomendado que você evite chegar à primeira etapa de majoração para evitar complicações futuras.
Qual a diferença entre a taxa marginal de imposição (TMI) e a taxa média de imposto?
Quando falamos sobre as alíquotas de imposto na França, muitas pessoas podem pensar que a taxa se aplica a toda a renda. No entanto, isso não é verdade. A Taxa Marginal de Imposição (TMI) é a alíquota mais alta que a pessoa paga sobre a parte superior de sua renda. Já a taxa média de imposto é calculada dividindo o imposto total pago pela renda anual tributável.
Vamos a dois casos práticos:
- Caso 1: Com uma renda tributável de 35.200 € e um imposto final de 2.790 €, a pessoa se encontra na TMI de 30%. No entanto, a taxa média de imposto é calculada como 2.790 € / 35.200 € = 7,93%.
- Caso 2: Após aplicar a dedução máxima por quociente familiar, a renda tributável é de 66.600 €, e o imposto final é de 4.654 €, resultando em uma taxa média de 6,99%.
Posso declarar o IR retroativo de outros anos?
Sim, é possível fazer a declaração de Imposto de Renda (IR) retroativa para anos anteriores. No entanto, será necessário pagar as multas de atraso, conforme mencionado anteriormente. Para estudantes recém-formados, essa penalidade geralmente não é um grande obstáculo.
Para declarar os anos anteriores, você deverá preencher o formulário 2024 correspondente a cada ano e explicar a situação.
Conclusão
Depois de explorar os detalhes de alguns dos mecanismos menos comuns no Imposto de Renda (IR) na França e apresentar o passo a passo para a primeira declaração, vamos resumir as etapas no esquema abaixo:
Este post é uma continuação da primeira parte, onde abordamos o IR de maneira geral. Aqui, focamos nas particularidades do sistema tributário francês, explicando como os estrangeiros podem aproveitar os diversos benefícios fiscais disponíveis. Além disso, detalhamos o processo de preenchimento do formulário 2024 para a primeira declaração de imposto, destacando que, embora possa parecer complexo, o processo não é um “bicho de sete cabeças”.
Manter-se em dia com a declaração de imposto é essencial, não apenas para cumprir a legislação francesa, mas também para aproveitar todos os benefícios sociais e outros direitos que o país oferece, sendo estrangeiro ou não.
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Olá, sou Valquir, engenheiro civil, investidor e nerd. Já morei nos Estados Unidos, Brasil e agora na França. Estou aqui para transmitir um pouco do que já passei e dar as minhas percepções. Espero que goste do conteúdo preparamos com carinho. Qualquer coisa só mandar um email 😉